30 de setembro de 2020

Presença de doulas se mostra cada vez mais necessária para humanização do parto

Divulgação

Audiência debateu projeto em tramitação na Assembleia Legislativa que regulamenta a presença das doulas na hora do parto.

Relatos com experiências positivas de mulheres que tiveram o acompanhamento de doulas no momento do parto, como o da jornalista Maira Zimermann e de Andressa Daryê de Souza, mães que também puderam optar pelo parto natural; de doulas, como Miriam  Baetel, terapeuta, que se tornou doula após uma experiência traumática de violência obstétrica e Mônica Balsano, que contou um pouco do ofício, ao longo de anos, fizeram parte dos debates de uma audiência pública remota realizada ontem, 29, pelos deputados Mabel Canto (PSC), Gilson de Souza (PSC) e Goura (PDT), autores do projeto de lei 388/2020, que permite a presença de doulas durante todo o período de trabalho de parto e pós-parto imediato, sempre que solicitadas pela parturiente em maternidades, casas de parto e estabelecimentos hospitalares congêneres, da rede pública e privada do Paraná.

“Para nós é uma grande satisfação estarmos falando sobre isso, porque nosso objetivo é ampliar os direitos das gestantes do Paraná e proporcionar segurança a elas”, disse a deputada Mabel Canto, que deve apresentar um substitutivo-geral ao texto original a partir de sugestões dadas durante a audiência. “Queremos ouvir o que os nossos convidados têm a nos acrescentar para aprimorarmos o projeto no que for possível. Nosso objetivo é poder contribuir com a sociedade e chegar a um consenso entre os hospitais, as doulas e as mães”, afirmou o deputado Gilson de Souza.

“O projeto foi protocolado com o intuito de ouvir os principais interessados para que cheguemos a um consenso. Estou na luta pela humanização do parto e contra a violência obstétrica. E esse debate é fundamental para avançarmos numa política pública que atenda a todos os envolvidos”, ressaltou o deputado Goura. A procuradora da Mulher da Assembleia Legislativa, deputada Cristina Silvestri (CDN) também participou. “O nascimento de um filho é o momento mais importante na vida de toda a família, especialmente da mulher. E já ouvi muitos relatos de experiências ruins para a parturiente. Então, eu vejo a presença da doula como um direito dessa mulher, assim como ela ter o direito de escolher a forma de parto que quer fazer”, afirmou a parlamentar.

A elaboração do projeto se deu a partir de leis já aprovadas e de propostas que já tramitaram na Assembleia. A doula é uma assistente de parto, sem necessariamente formação médica, que acompanha a gestante durante o período da gestação até os primeiros meses após o parto, com foco no bem-estar da mulher. A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece o trabalho das doulas, mas no Brasil e no Paraná não há uma regulamentação para a presença delas nas maternidades. E, muitas vezes, os hospitais restringem essa presença na hora do parto. Há um projeto de lei federal em tramitação desde 2017 e a proposta em discussão em nível estadual.

Como detalhou em ordem cronológica Patrícia Teixeira, presidente da Associação de Doulas de Curitiba e Região Metropolitana, o movimento das doulas no Brasil começou efetivamente em 1978, no Rio de Janeiro, o que culminou com o resgate da humanização do parto e com a valorização do parto natural. Mas houve resistência dos profissionais de saúde.

Em 2005, esse trabalho começou em Curitiba, segundo Patrícia. “Em 2016, sentimos a necessidade de regulamentação. Em abril de 2017, foi fundada a Associação de Doulas de Curitiba e Região Metropolitana. Em abril de 2018, foi fundada a Federação das Doulas. Hoje temos a Associação de Doulas do Paraná. Estamos avançando, porque no Paraná, dez municípios já têm suas legislações, incluindo Curitiba. As doulas vieram para ficar. O projeto estadual será um importante passo para isso”, observou.

PARTICIPAÇÕES – O principal foco da audiência pública foi a regulamentação do ofício de doulas, que todos concordaram:  devem ter as atribuições previamente estipuladas, porque contribuem significativamente para a humanização do parto e para o combate à violência obstétrica.

Pesquisas demonstram que o acompanhamento dessas profissionais tem reduzido em até 50% a taxa de cesáreas, diminuído em 20% a duração do trabalho de parto e em 60% os pedidos de anestesia. Além disso, foi registrada queda de 40% no uso de oxitocina e de fórceps. Conceito reforçado por Lívia Martins Salomão, que coordena o Núcleo de Promoção de Defesa dos Direitos da Mulher (NUDEN) da Defensoria Pública do Paraná, “A gente precisa pensar na mulher como protagonista no momento do parto e ela deve ser tratada com o respeito que merece. O que inclui o trabalho da equipe médica e, ao mesmo tempo, pensar nesse respeito é também garantir a presença das doulas no momento do parto”.

“Promover o bem-estar da parturiente é o objetivo e nesse momento é que as doulas se inserem como esse suporte emocional na humanização do parto. O que me preocupa é que há grande resistência ainda.  Então, é preciso lembrar e separar o papel dessa profissional. Não é atribuição da doula alguns procedimentos. Por isso, minha sugestão é que o projeto deixe bem claro as atribuições da doula nesse momento”, sugeriu Michele Ribeiro, promotora de Justiça do Centro Operacional das Promotorias de Proteção à Saúde do Ministério Público do Paraná.

Pela Federação das Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do Estado do Paraná, Phillipe Fabrício de Mello, afirmou que a Federação não se opõe à presença de doulas, mas reforçou a importância da regulamentação dessa prática. “Achamos que as legislações municipais já construídas não são as ideais. Por isso, será importante uma lei estadual que se sobreponha a elas e assim, o Paraná pode se tornar vanguarda nesse tema”, enfatizou.

Como representante da Federação das Santas Casas de Misericórdia e Hospitais Beneficentes do Estado do Paraná, Thalita Daiane Cândido, lembrou que 60 instituições integram a Federação e dedicam mais de 60% dos atendimentos aos pacientes do SUS. Ela ressaltou que a Federação também é favorável à presença das doulas e reconhece a importância dessas profissionais, mas sugeriu um cadastro, onde conste toda a documentação já prevista no projeto de lei. “Isso precisa ser feito com antecedência, já que as normas dos hospitais estão nesse documento. Assim, não haverá espaço para conflito nem interferência no trabalho de cada profissional”.

Lenira Senesi, que representou a Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia do Paraná, apresentou um documento em nome dos ginecologistas paranaenses sobre o tema. Entre os principais pontos “a vedação de cobrança para o caso de atendimento a pacientes do SUS, espaços adequados para esse atendimento, paramentação e cadastro”. “Nós também engrandecemos o trabalho das doulas na humanização dos partos e no aumento de partos naturais, mas a regulamentação é fundamental “, alertou.

A audiência contou ainda com a participação do médico obstetra Braulio Zorzella, que coordenou maternidades do SUS, foi médico de UBS e maternidades públicas por oito anos.  Ele também representou a Rede de Humanização do Parto e Nascimento e fundou o Projeto Obstare, curso de capacitação/atualização obstétrica para profissionais da saúde.  Para ele, a doula não substitui ninguém na equipe de parto. “Há uma horizontalidade nas funções de cada profissional.  A doula é uma nova figura nesse contexto. Quem não concorda com a presença dela, precisa entender que a sua função é necessária para tornar o parto mais seguro para a parturiente. Mas concordo também que a discussão é importante, justamente porque é uma situação nova, mas devemos lembrar que representa o futuro do bem-estar das gestantes”, afirmou em sua fala.

Patrícia Teixeira acredita que, no caso da regulamentação, o SUS precisaria arcar com os custos com o serviço. “Nós, doulas, temos esse ofício como ganha pão. E quando fazemos um contrato com uma gestante, estamos disponíveis para ela 24 horas”, alegou.

Participaram ainda, irmã Iracema, diretora-geral do hospital Mater Dei; Paula Fernandes, fotógrafa de partos e ativista do parto humanizado; Cris Kutner, enfermeira obstétrica; e Maria Isabel Corrêa, presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher.

Todas as considerações feitas ao longo do debate serão encaminhadas à Secretaria Estadual da Saúde (SESA). A coordenadora de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Cássia Nars, também participou do encontro. (Com assessoria)


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